MAGNO PIRES Alves Filho

(1942). Quarto e Atual Ocupante da Cadeira nº 26 da APL. 

Advogado, jornalista e escritor, nascido no município de Batalha (PI), no dia 27-12-1942. Filho de Magno Pires Alves e Maria do Rego Lajes Alves. Bacharel em Direito pela tradicional Faculdade da Universidade

de Pernambuco e em Administração de Empresas pela Faculdade de Olinda. Foi membro do Serviço Jurídico da União, servindo na Consultoria Jurídica do Ministério das Comunicações. Em 20017, foi Secretário Municipal de Desenvolvimento Econômico, Assistência Social e do Trabalho – SEMDES de Timon – MA. Membro efetivo da Academia de Letras e Jornalismo do Estado do Piauí. Proprietário do Portal Magno Pires, criado em 2009. É atualmente, no Piauí, secretário de Administração do Governo do Estado (1998). Jornalista e articulista nos principais jornais de Recife, entre os quais, citamos: Jornal do Comércio e Diário de Pernambuco, e no Piauí nos jornais O Dia, O Estado, Diário do Povo e Meio Norte, todos de Teresina. O Escritor. Pertence à Academia Piauiense de Letras e à Academia de Letras do Vale do Longá. Bibliografia. O Piauí no Nordeste, crônicas, 1977; Promessas e Protestos, 1985; Ministro Petrônio Portela, crônicas, 1979, e Desabrochar das Rosas, 1996.

Fragmentos do seu discurso de posse na Cadeira nº 16, da Academia Piauiense de Letras, proferido em 05/10/1995, no Centro de Convenções:

O poeta Lucídio de Freitas foi um dos fundadores da Academia Piauiense de Letras-APL. Coincidindo a sua fundação com a eclosão da Revolução russa de 1917. E foi o sentimento poético de Lucídio que definiu a sua feição precursora no movimento literário piauiense e certamente galvanizou as ideias político-filosóficas que o mundo experimentava com o movimento comunista surgido no início deste século.

Daí, não podermos excluir a correlação existente entre a criação das academias de letras no Brasil e no Piauí e o surgimento de uma nova ordem sócio- político-econômica no mundo. A ordem social na Rússia, com os czares, favoreceu um movimento internacional às inovações de que estávamos a necessitar. A elite soviética abespinhou as camadas sociais desfavorecidas, injustiçadas, com a interferência e a espoliação das potências capitalistas e colonialistas representadas pelo Japão e a Inglaterra, dando origem à mais longa revolução, consequentemente à mais longa reforma de um Estado, que se tem registro na História recente da Humanidade.

Idealista e poeta, com inexcedível sensibilidade, transferiu ao pai, Clodoaldo Freitas, a incumbência de ser o presidente da novel Academia de Letras, juntando-se a outros expoentes da inteligência piauiense e brasileira, como Higino Cunha, Abdias Neves, Félix Pacheco e Olavo Bilac.

Talvez, acrescento eu, com espírito crítico construtivo, Lucídio Freitas, transferindo ao pai a presidência da Academia – pois declinou de ser o seu primeiro presidente – preferindo ficar no campo de ação intelectual e ideológica em defesa de suas ideias – que eram as da conjuntura de então – cuidar da consolidação, provavelmente burocrático, da novel academia.

Os idealistas – e Lucídio Freitas era um deles – prescindem de tudo o que material, temporariamente prestigioso, para defender as suas ideias, permanecendo ao lado destas em quaisquer circunstâncias. O próprio poema denuncia esta evidência.

Prescrutadoramente os olhos ponho no que fui, no que sou, no que hei de ser, E alucinado dentro do meu sonho, sinto a inutilidade do nascer. 

(De Lucídio Freitas em Vida Obscura)

Comentários 

Magno Pires vale uma das penas nobres e aprimoradas inteligências que o Piauí confiou à imprensa do Recife, projetado por sua interpretação séria dos problemas nacionais de maior evidência. (A. Tito Filho)

Fonte: Revista da Academia de Letras do Vale do Longá, 1995.

DAGOBERTO Ferreira de CARVALHO JÚNIOR

(1948). Terceiro e Atual Ocupante da Cadeira nº 25 da APL. 

Médico. Pesquisador (Arquivo Histórico Ultramarino/Instituto de Cultura e Língua Portuguesa-Lisboa). Historiador (Mestrado em História pela Universidade Federal de Pernambuco). Natural  de  Oeiras,  Estado  do  Piauí  (1948).

“Historiador e intérprete da história política e social do povo do sertão de dentro e do Piauí”, prof. A. Tito Filho. Obras publicadas: História Episcopal do Piauí, 1980; Passeio a Oeiras, 1982; A Obstetrícia no Piauí, 1989; A Tábula de Retalhos no Piauí, 1990, e A Palavra e o Tempo, 1992. Opúsculos: José Luiz da Silva: de Cirurgião da Armada a Primeiro Médico do Piauí, 1980; Um Tempo do Recife, 1982, e A Cidadela do Espírito – considerações sobre a arte sacra na obra de Eça de Queiroz (1944). Pertence às seguintes instituições: Academia Piauiense de Letras, cadeira nº 25; Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico de Pernambuco; Instituto Histórico de Oeiras; Comitê Norte- Nordeste de História da Arte; Academia de Artes e Letras de Pernambuco (Emérito); Instituto Histórico de Olinda; Instituto Histórico de Vitória de Santo Antão e à Sociedade Brasileira de Escritores Médicos – Regional do Piauí (presidente e fundador).

CATEDRAL DE OEIRAS (1733-1983)

Sinopse Histórica

A matriz de Nossa Senhora da Vitória de Oeiras é o primeiro templo regular do Piauí e a mais antiga igreja de todo o Estado. Sua construção data de 1733. A ereção canônica, de 1696. Nesse ano, criou D. Frei Francisco de Lima, Bispo de Pernambuco, jurisdição eclesiástica a que então se sujeitava todo o imenso Sertão de Rodelas, a Freguesia de Nossa Senhora da Vitória. O local escolhido, aceitas as sábias considerações do Padre Visitador Miguel de Carvalho em sua famosa Descrição do Sertão do Piauí, publicada, depois, por Ernesto Ennes em A Guerra dos Palmares, foi o Brejo da Mocha. A decisão, tomou-se na Fazenda Tranqueira em 11 de fevereiro de 1697, lavrando-se a ata que se transcreve pela importância documental do que para história registra:

Anno do Naçim.to de Nosso Senhor Je Chisto de mil e seissentos e noventa e sette aos honze dias do mês de fev.ro estando o R. do Vig.ro da Vara o Lecenciado Miguel Carvalho na faz.da do tranq.ra nas caza da morada de Antônio Soares Thouguiam, mandou vir perante si os moradores nomeados na Pastoral q. trazia do llustrissimo, e Reverendissimo senhor Bispo de Pernambuco, e em presença delles e dos mais Abayxo a asignados, a mandou ler, e declarar, por modo q. todos a entenderão e lhe pediu seos votos p. a eleição do lugar em q. se divia fundar a Nova Matris de Nossa Senhora da Victoria, e Conusultando entre todos, asentarão, votarão e detriminarão, que se fundaçe, e fizece a Ig.ja no Brejo, chamado a Mocha por ser a parte mais conveniente aos Moradores de toda a Povoação, ficando no meio della com iguais distançias, e Caminhos p. a todos os riachos e partes povoadas e detriminada a Sobre dita parte, se elegeu p. a todos os riachos e partes povoadas e detriminada a Sobre dita parte, se elegeu p. a lugar de Ig.ja e Cazas do R. do cura, o taboleiro que se acha pegado a passayem do Jatubá p. a a parte do todo o Breyo do sobre dito Riacho da Mocha, e de como assim o detriminarão Mandou o R. do Vig. Rio da vara fazer este termo, q. asignou com todos os que Baixo se Contem. E eu Antônio dos Santos e Costa escrivão eleito o escrivi.

 

Miguel D. Carvalho
Jozeph Gracia
Antº da Cunha Sotto Mayor
Francº Machado
Chistovão de Britto de S. Paijo
Antonio Soares Thouguia
Francº Cardoso da Rosa
Pedro Nunes Pinheyro
Pe. Alz dOlivrº
Ants Dantes de Azdº
Frc  Dias de Siqº
Antº Nunes Barreto”

 

Já a 2 de março de 1697, estava solenemente inaugurado, de taipa e pindoba, primeiro templo regular do Piauí em derredor do qual prosperaria a povoação do Mocha. Estava plantada entre nós a semente da fé. Esta capela primitiva constava, diz o termo, “de 24 palmos de comprido e doze de largo, feita com a decência possível…” Mas, já naquela data recuada em que “deu o Ver. Vigário da Vara posse ao novo Cura o Ver. licenciado Thomé de Carvalho e Silva, da nova capela, com todas as cerimônias costumadas de fechar e abrir portas, consertar altar, abrir e fechar missal, estender e dobrar corporais, dobrar e desdobrar ornamentos e ultimamente lendo publicamente ao povo a Provisão que trazia do Ilustríssimo e Reverendíssimo Senhor Bispo de Pernambuco”, benzeu também o Padre Miguel “um quadro que de redor da capela consignou com marcos de pedra para sepultura de defuntos e donde se há de fazer a nova igreja, o qual tem cem passos de comprido e sessenta de largo”. A atual matriz de Oeiras, igreja principal do Piauí, estava, portanto, nos planos imediatos dos fundadores da freguesia. Thomé de Carvalho, Vigário fundador foi quem a construiu, como hoje a temos, de pedra e saibro, inaugurando-a trinta e seis anos depois da bênção da primeira capela. O documento maior, é, sem dúvidas, a inscrição latina contida em arranjo floral sobre a portada da nave: HOC EST DOMUS DOMINI – FIRMITER AEDIFICATA ANNO DOMINI 1733.

A própria cidade é, bem podemos dizer, um presente da Igreja de Nossa Senhora da Vitória. Criada a freguesia em 1696, definiu-se o povoamento. Em 1712, veio a Vila do Mocha que se instalou solenemente em 26 de dezembro de 1717. No ano seguinte criou-se a Capitania. Em 1758 nomeou-se o primeiro governador. Em 13 de novembro de 1761, impôs João Pereira Caldas, investido nessa função a 29 de setembro de 1759, o nome Oeiras à Vila do Mocha. Homenageava assim o Ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, então Conde de Oeiras, depois Marquês de Pombal. À Capitania deu Pereira Caldas o nome de São José do Piauí, em honra de S. M. o senhor D. José. Oeiras foi a capital do Estado até 1852.

Também a história religiosa do Piauí prende-se de tal modo à Matriz de Oeiras que de uma não se pode falar sem que da outra muito se diga. Sede do Vicariato Geral do Piauí desde 1769 até o governo eclesiástico do Cônego João de Sousa Martins (1840-1871), foi a referida igreja cogitada inúmeras vezes para Catedral da Diocese do Piauí. Se a tal não chegou em virtude da mudança do governo temporal – a Diocese do Piauí só foi criada pela Bula Supremum Catolicum Eclesiam de 10 de março de 1901 – é, desde 1944, sede da Diocese de Oeiras.

As reformas porque passou a igreja não foram muitas nem a descaracterizaram a ponto de não a podermos ter como monumento maior do Piauí. De arte e de fé. De história, sobretudo. É monumento tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e foi recentemente restaurada pelo Programa de Cidades Históricas e Coloniais do Nordeste, da Secretaria de Planejamento da Presidência da República.

Fonte: CARVALHO JR., Dagoberto. Estação Saudade: memórias recorrentes. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2015, Coleção Centenário nº 35.

TERESINHA de Jesus Mesquita QUEIROZ

(1955). Ocupante da Cadeira nº 23 da APL. 

Teresinha Queiroz é professora e escritora. Nasceu em Esperantina, Piauí, onde fez seus estudos primários e secundários. Os pais: Félix Cardoso de Queiroz e Joaquina Mesquita de Queiroz. Licenciada em História pela Universidade Federal do Piauí (1977) e Bacharelada em Ciências Econômicas pela mesma IES (1983). Fez mestrado em História do Brasil (1984) na Universidade Federal do Paraná, em Curitiba, e doutorado em História Social na USP (1992). É professora da UFPI desde 1979, lotada no Departamento de Geografia e História do CCHL, leciona no curso de graduação em História, nas áreas de Teoria e Metodologia da História e Métodos e Técnicas de Pesquisa. Bibliografia: Economia Piauiense: da pecuária ao extrativismo, Teresina, APECH/UFPI, 1993; Os Literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as Tiranias do Tempo, Teresina, Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1994; A Importância da Borracha e da Maniçoba na Economia do Piauí: 1900-1900, Teresina, APL/UFPI, 1994; História, Literatura, Sociabilidades, Teresina, Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1998.

Comentários: 

Que realça neste livro (História, Literatura, Sociabilidades) admirável da Prof. Teresinha Queiroz, uma das argutas estudiosas de nossa história? Já nos havia ela proporcionado em estudo anterior – Os Literatos e a República: Clodoaldo Freitas, Higino Cunha e as Tiranias do Tempo – a dimensão do seu talento e os primores de sua cultura universalista, de sua capacidade investigativa, de seu estilo claro e elegante, dos mais perfeitos que temos entre os novos autores. “Agora, como se completa, neste painel admirável dos aspectos mais fascinantes de nossa história social, que é o processo de mudança operado do final do século passado para o início do atual em nossa vida social e política. (Manoel Paulo Nunes, ex-presidente da APL).

Fonte: QUEIROZ, Teresinha – História, Literatura, Sociabilidades. Editora Halley S. A., 1998. QUEIROZ, Teresinha (org.). Conversa com M. Paulo Nunes. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2012, Coleção Centenário nº 5.
QUEIROZ, Teresinha. Literatura, Sociabilidade. 2ª ed. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2015, Coleção Centenário nº 27.

NILDOMAR da Silveira SOARES

(1937). Quinto e Atual Ocupante da Cadeira nº 22 da APL. 

(Teresina-PI, 1937). Professor, jurista e escritor. Bacharel em Direito pela Universidade do Brasil. Ex- Presidente da Ordem dos Advogados-PI. Ex-assessor Jurídico do Banco do Brasil, no Piauí. Assistente Jurídico da Prefeitura de Teresina. Professor da Escola Superior da Magistratura, no Piauí. Juiz Eleitoral substituto do TRE/PI. Bibliografia. Juizado Especial Civil – A Justiça da Era Moderna, 1996; Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Estado do Piauí, 1996; Princípios Elementares do Organização Jurídica do Estado do Piauí; e Eleição, 1998.

Excerto do seu discurso pronunciado por ocasião de sua posse na Academia Piauiense de Letras.

Ingresso no Templo de Lucídio Freitas com muíto orgulho, Estou consciente do papel de singular relevo que as Academias têm por desenvolver no novo milênio. Há, entre tantas missões, de engajar-se esta Academia na luta contra a “desnacionalização linguística”, como definiu o crítico literário Wilson Martins. Há que apoiar movimentos de Defesa da Língua Portuguesa. Há, portanto, que – com grandeza e autoridade – procurar resgatar o idioma da danosa da “desnacionalização” que desfigura a nossa língua, levando à errônea conclusão de ser pobre, sem beleza, vaga e limitada, quando dispomos de 400 mil vocábulos, aliás um número igual ao inglês, segundo o filólogo Antônio Houaiss. Há, em suma, demonstrar que o português é dotado de incontáveis recursos léxicos capazes de acompanhar as inovações, as novas descobertas e as infreáveis mudanças por que passam o mundo moderno. Por outra lado, não obstante seja a Academia Piauiense de Letras uma instituição emblemática da cultura piauiense, nada impede possa ela conciliar e manter atuantes as duas coordenadas da tradição e da modernidade que “hão de constituir as referências obrigatórias deste esforço sinérgico de harmonia; os elementos fundantes da tradição e a necessária renovação ditada pelo novos tempos”, segundo o acadêmico Tarcísio Padilha, da Academia Brasileira de Letras. Acrescenta aquele imortal que “a cultura brasileira se opulenta a cada geração”, levando-me a comungar do entendimento de que esta Academia “há de estar atenta às modulações das ideias, das crenças e dos valores para inserir na ação cultural a sua marca e o seu peso institucional, de modo a abrir-se crescentemente a um fecundo diálogo com as demais entidades culturais”, tudo em benefício do Piauí, na permanente busca da humanização da cultura deste povo.

Fonte: SILVEIRA, Nildomar. Livro do Centenário da Academia Piauiense de Letras. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2018, Coleção 100 ANOS nº 1.

DILSON LAGES Monteiro

(1973). Quarto e Atual Ocupante da Cadeira nº 21 da APL.

Dílson Lages Monteiro. Professor. Poeta. Romancista. Ensaísta. Nasceu em Barras do Marataoã em 1973. Filho de Gonçalo Soares Monteiro e Rosa Maria Pires Lages. Viveu a infância e a pré- adolescência na cidade natal, cuja paisagem física e humana deixou fortes marcas em sua literatura, assinalada tanto pela exaltação de elementos naturais e de costumes, quanto de contundente crítica social. Graduou-se em Letras pela Universidade Estadual do Piauí em 1994. Especializou-se em Língua Portuguesa (PUC-SP) e em Revisão de Textos (PUC-MG). Autor, até a data de edição desta obra, de 14 livros, passeando por gêneros diversos: da literatura infantil ao romance. São de sua autoria os livros: Mais Hum (poemas – 1995); Cabeceiras: a marcha das mudanças (estudo historiográfico – 1995) coautoria; Colmeia de concreto (poemas – 1997); Os olhos do silêncio (poemas – 1999); A metáfora em textos argumentativos (ensaio – 2001); O sabor dos sentidos (poemas – 2001); Entretextos (artigos e entrevistas – 2007); Texto argumentativo – teoria e prática (didático – 2007); Adiante dos olhos suspensos (poemas – 2009); O morro da casa-grande (romance – 2011); O rato da roupa de ouro (infantil – 2012); Ares e lares de amores tantos (poemas – 2014); Meus olhinhos de brinquedo (poema infantil – 2014); Capoeira de espinhos (romance – 2017).

Sua poesia pós-moderna apresenta claros traços neo-românticos, neo- simbolistas e principalmente surreais, com grande utilização dos tropos, principalmente da metáfora, empregada à exaustão. Sobre sua dicção poética, registrou em prefácio o professor de Teoria Literária da Universidade de Brasília Ricardo Araújo: A poesia de Dílson Lages tenta recuperar através do sentidos ‘O sabor das imagens’, propondo novas associações de imagens e aumentando, ampliando o horizonte de possibilidades metafóricas, ou seja, Lages cria novas metáforas buscando ilações inusitadas e auscultando os diversos sons provenientes destes seres peculiares que integram a personalidade humana de cada um de nós”. Segundo o crítico literário Rogel Samuel, em artigo sobre a poesia de Dílson, “É uma poesia mínima, reduzida ao mínimo, no minimalismo característico do pós- moderno, o nosso tempo (…). Esta poesia faz das coisas uma concretude e não uma imagem, pois a realidade é tanta que ‘a água na vidraça / despedaça…” e o mundo se descerra em ‘faces e disfarces’. Nesse caso, o silêncio é um consolo, pois serve para ‘arrancar o coração das paredes’”.

A prosa escrita por Dílson Lages Monteiro é marcada por nítido compromisso social, em que o memorialismo se alia ora ao lirismo, ora à sátira. Em conferência sobre a obra O morro da casa-grande, anota a professora universitária Rosidelma Fraga: “A retenção do tempo perpassa no romance, nas imagens das fotografias (outro código de linguagem) e, aos poucos, vai sendo reescrita e reinterpretada nos moldes da ficção em densidade lírica, mesclando romance e poesia. A identidade patrimonial da terra sacramenta-se na memória de um romancista que não consegue desvencilhar de sua grande sensibilidade de poeta, descortinando para o leitor um documentário histórico de várias gerações que viram os sonhos de fé e devoção destruídos. O leitor de alma vazada não consegue ficar alheio ao sentimento mais cruel e melancólico dos personagens que protagonizaram a amargura proveniente da demolição do lugar sagrado das famílias religiosas em Barras, Piauí”.

Dilson Lages é membro da Academia Piauiense de Letras, tomando posse em 2015, ocupando a cadeira de número 21 que tem como patrono Cônego Leopoldo Damasceno Ferreira.

Comentários 

Para o crítico Manoel Hygino dos Santos, que descreve com exatidão:

O morro da casa-grande trata-se de “um trabalho interessante, a que não faltam vocábulos praticamente não usados no Sudeste e no Sul, expressões bem próprias do interior piauiense. Um texto agradável, com uma narrativa que tem propósitos claros, entre os quais, o de proteger tanto quanto possível o legado das velhas gerações”

Fonte. Hoje em Dia, Belo Horizonte, 11.02.2010.

RAIMUNDO JOSÉ Airemoraes Soares

(1933). Quarto e Atual Ocupante da Cadeira nº 20 da APL. 

(São Pedro do Piauí-PI, 30-03-1933). Sacerdote e professor emérito. Curso de Filosofia no Seminário Maior de Olinda, Pernambuco. Diplomado em Filosofia pela Academia Romana de Santo Tomás

em Roma, Itália. Bacharel e licenciado (mestrado) em Sagrada Escritura, pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, Itália. Bacharel e licenciado (mestrado) em Teologia, pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. Curso de Extensão em Didática do Ensino Superior, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, e curso de Doutorado (PhD) em Teologia Pastoral, pela Universidade de Montreal, Canadá. Encargos e atividades exercidas: membro do Conselho Estadual de Educação do Estado; coordenador Pastoral da Arquidiocese de Teresina; assessor nacional da CNBB para as áreas de Leigos, Juventude e Família; diretor do Instituto Nacional da Pastoral (RJ e BR); subsecretário-geral da CNBB para assuntos de Pastoral; assessor de Assembleias Gerais do Episcopado Latino-americano em Mar dei Plata, Argentina e Medelin, Colômbia; assessor dos Bispos do Brasil (CNBB) nos Sínodos Gerais do Episcopado Universal, em Roma; participante de reuniões e encontros internacionais sobre a Terceira Idade na Itália, na Colômbia e no Brasil; participante de Assembleias da Federação das Universidades Católicas do Mundo e da Federação dos Institutos de Filosofia e Teologia Católicas do Mundo, em Porto Alegre, Brasil e Washington; professor da Faculdade Católica de Filosofia do Piauí; professor de Filosofia da Natureza em cursos de Pós- graduação na UFPI; diretor da Faculdade Católica de Filosofia do Piauí. Exerce atualmente as funções de diretor de Estudos do Seminário Maior Sagrado Coração de Jesus, em Teresina. Membro do Conselho Presbiteral da Arquidiocese de Teresina. Vigário Episcopal de Teresina para Associações e Movimentos. Assistente Nacional do Instituto Secular “Caritas Christi”. Pertence a Academia Piauiense de Letras cadeira nº 20.

HERCULANO MORAES da Silva Filho

(1945). Terceiro e Atual Ocupante da Cadeira nº 18 da APL. 

Poeta, ensaísta, cronista, contista, romancista e crítico literário. Figura das mais destacadas e atuantes nos meios intelectuais do Estado. Jornalista dos mais brilhantes. Nasceu em São Raimundo Nonato, Estado do Piauí (1945). Ocupou importantes cargos na administração piauiense, entre os quais destacamos:

Secretário de Estado da Comunicação Social do Governo do Piauí, Diretor da Casa Anísio Brito e do Theatro 4 de Setembro. Atualmente, é Assessor Especial do Gabinete do Governador. Vereadora Câmara Municipal de Teresina no período de 1971-1973. O Escritor. Autor de preciosas obras publicadas. É um dos intelectuais mais lidos no Estado. Bibliografia. Poeta, é autor dos seguintes livros: Murmúrios ao Vento, 1965; Vozes Sem Eco, 1967; Meus Poemas Teus, 1968; Território Bendito, 1973; Seca, Enchente, Solidão, 1977; Pregão, 1978; Legendas, 1995; Oferendas, 1996. Romancista, escreveu: Fronteira de Liberdade. Ensaísta, é autor da Nova Literatura Piauiense, 1975; Visão Histórica da Literatura Piauiense, quatro edições; Fascículos de Literatura Piauiense, em que estuda: volume 1: Da Costa e Silva, volume 2: Assis Brasil; volume 3: Álvaro Pacheco; volume 4. Fontes Ibiapina; volume 5: O. G. Rego de Carvalho, Da Costa e Silva e Assis Brasil. É membro da Academia Piauiense de Letras, da Academia de Letras do Vale do Longá e da Academia de Letras do Médio Parnaíba. Fundador e primeiro presidente do Círculo Literário. Membro da União Brasileira de Escritores (seccional do Piauí e seccional de São Paulo). “Príncipe dos Poetas do Piauí” (1969). Homem de Ação (1982). Intelectual do Ano – prêmio Cabeça-de-Cuia (1987). Honrarias. Cidadão honorário das cidades: Teresina, Barras e Campo Maior. Comendador da Ordem do Mérito Renascença do Piauí. Medalha do Mérito Visconde da Parnaíba. Cidadão da Cultura Popular (Salvador-Bahia).

Vejamos, a seguir, duas poesias de muita sensibilidade e opulenta criatividade de Herculano Moraes:

CANTIGAS DE MINHA TERRA

Um dia nós exportamos Milhares de marruás
O gado manso tangido pelos sertões De vastos carnaubais
No lombilho do jumento Ou sobre os trilhos de aço
A cera de carnaúba Desenvolvia o progresso
Bendito tempo de glória… Dentro dos sacos de açúcar
O coco de babaçu teve parte na história…
Ciclo bendito da riqueza brasileira
Velho tempo de fartura contado por meus avós
– Pra nossos netos, Socorro, Que lembrança teremos nós?

(Território Bendito, 1973)

GRAVURA

Não escreverei teu nome na areia.
O vento varre as palavras
e elas nunca se perpetuarão.

Escrever teu nome no tronco de uma árvore?
eis o enigma desta vã filosofia.
Até que a morte nos separe pelo assassínio da ecologia.
Escrever teu nome nos granitos, no cimento, nas nuvens,
nos muros rabiscados,  talvez não seja a forma exata de te imortalizar.
Escreverei, teu nome sim
na folha indecifrável da memória, pois só assim este amor
sem preconceitos e limites ficará para a história.

(Oferendas, 1996).

Comentários 

Do lirismo sentimental dos primeiros livros ao regionalismo poético de Seca, Enchente, Solidão, Herculano Moraes se realiza melhor quando testemunha, quer através da linguagem ou da temática, a realidade interiorana. Esta é uma constante dos poetas piauienses, inclusive do melhor deles, na fase nova que é H. Dobal. O próprio Herculano Moraes, referindo- se àquele livro e a Pregão, diz que a sua poesia “é terra, sangue, força de uma região subdesenvolvida, mas sempre tangida pela esperança”. (Assis Brasil)

Fonet: MORAES, Herculano. Visão Histórica da Literatura Piauiense. 6ª ed. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2018, Coleção Centenário nº 71.

João Paulo dos REIS VELLOSO

(1931). Terceiro e Atual Ocupante da Cadeira nº 17 da APL. 

Economista e professor. Nasceu em Parnaíba, em 1931. Formado pela Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Rio de Janeiro; pós- graduado pelo Conselho Nacional de Economia (1961); Master em Economia pela Universidade de Yale (EUA), recebendo o diploma Ph.D e granjeando o primeiro lugar; membro da Academia Piauiense de Letras, cadeira nº 17. Cargos e funções exercidas: professor de Pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas. Participante do projeto da criação do Instituto Nacional do Cinema e do Museu de Arte Moderna. Assessoria do Ministro Roberto Campos, tendo, juntamente com Mário Henrique Simonsen, elaborado o projeto de criação do IPEA – Instituto de Planejamento Econômico em 1969. Ministro-chefe da Secretaria de Planejamento da Presidência da República.

Transcrevemos, a seguir, um trecho da obra Brasil: a solução positiva.

CAPITULO I

O CRESCIMENTO COMO FENÔMENO HUMANO

Antes de considerar a questão da sociedade que estamos construindo, é conveniente começar por colocação mais limitada, sobre a natureza do processo de crescimento.

O crescimento econômico, tomado, para simplificação da análise, apenas como o aumento continuado da renda per capita, não depende de fatores predominantemente econômicos.

Trata-se de um fenômeno humano por excelência ligado a atitudes e instituições sociais.

Pode-se considerá-lo um processo eminentemente cultural – no sentido sociológico – e político.

Político, porque é importante a vontade política da nação, de mobilizar-se para o esforço, as dificuldades, os desajustamentos, o sentido de realização, os benefícios inerentes ao desenvolvimento.

Cultural, porque diz respeito, principalmente, ao modo de ser da sociedade. Cultura, aqui, “é o conjunto das tradições em que naturalmente uma sociedade vive, e que se modifica com a história mas permanece sempre fiel a certos elementos originais”.

Evidentemente, no crescimento, os fatores climáticos e os recursos naturais têm importância, no sentido de que podem facilitar ou dificultar a expansão econômica, abrir ou limitar oportunidades de investimento.

Não é à toa que os países de clima temperado se têm desenvolvido com facilidade relativamente maior, e não há forma mais simples de desenvolver uma economia primitiva do que pela exploração de seus recursos naturais. Mas mesmo esse fato óbvio deve ser qualificado.

Um estudo do Banco Mundial sobre Os Trópicos e o Desenvolvimento Econômico chegou a duas conclusões principais.

Primeiro, é inegável que as condições vigentes nos trópicos colocam limitações ao crescimento agrícola, pecuário e mineral dos países ali situados. Tais dificuldades não podem ser superadas por uma simples transferência da tecnologia existente nos países ricos, de zonas temperadas. Faz-se mister, por isso, adaptar e desenvolver tecnologia, para atender às condições especiais dos trópicos, naqueles setores.

Segundo, é possível que quando, eventualmente, as limitações dos trópicos forem superadas, tais países subdesenvolvidos passem a contar com vantagens na sua agropecuária, representadas pela luz solar, o calor e a quase infinita variedade da vida tropical.

No processo de crescimento, também são relevantes os fatores nitidamente econômicos, como a dimensão do mercado e a acumulação de capital físico, resultante da taxa de investimento.

Sem embargo, os fatores humanos são capazes de superar os demais condicionantes do processo.

O Japão mostrou ser possível construir uma potência econômica praticamente sem recursos naturais, e quase sem espaço geográfico. A dimensão do mercado e a acumulação de capital, em grande medida, podem ser condicionadas pelos fatores humanos.

E quais são esses fatores humanos?

Talvez a melhor análise do problema ainda seja a de Arthur Lewis, quando considera que as causas próximas do crescimento econômico são o engajamento na atividade econômica (ou seja, em fazer coisas com mais eficiência, obtendo maior resultado com certo uso de fatores produtivos, ou o mesmo resultado com menor uso dos fatores), a aplicação do conhecimento à solução de problemas econômicos (a inovação tecnológica), e o aumento do estoque de capital físico (investimento). Indo às causas das causas, ou seja, indagando quais os elementos que determinam o maior ou menor engajamento dos grupos sociais na atividade econômica, na exploração de oportunidades econômicas, Lewis destaca as atitudes sociais, originárias de crenças e escalas de valores, e as instituições sociais.

Como observa: “O crescimento econômico depende de atitudes em relação ao trabalho, à riqueza, à poupança, a ter filhos, à inovação, a coisas novas, à aventura, e assim por diante; e todas essas atitudes provêm de fontes profundas da mente humana”.

Entre as atitudes sociais que condicionam o comportamento econômico estão o desejo de possuir bens, ou seja, a atitude em relação ao bem-estar material; e o custo psicológico e físico do esforço para obter tal aumento de renda real.

Entre as instituições sociais benéficas à atividade econômica incluem-se: a recompensa pelo esforço feito, em termos pecuniários e sociais; a existência de estruturas favorecendo a especialização de atividades e a comercialização; e o grau de liberdade econômica, para a empresa e o indivíduo.

São, pois, fatores desse tipo que devem ser analisados, se desejamos entender as experiências de maior ou menor sucesso de diferentes nações, em diferentes épocas.

Note-se que tais tendências, favoráveis ou desfavoráveis, em maior ou menor escala, existem em todos os países, consoante a sua cultura. E estão sujeitas a evolução movida por fatores políticos, econômicos, sociais, históricos, espirituais – internos e internacionais. Da relativa preponderância de uns e outros fatores vai depender a aceleração ou desaceleração do processo de crescimento, em cada País, a médio e a longo prazo”.

Fonte: REIS VELLOSO, João Paulo. A Solidão do Corredor de Longa Distância: Brasil – Novo Modelo de Desenvolvimento. 2ª ed. Teresina: Academia Piauiense de Letras, 2018, Coleção Centenário nº 95.

EUSTÁCHIO PORTELLA Nunes Filho

(1929). Sétimo e Atual Ocupante da Cadeira nº 16 da APL. 

Médico, professor, conferencista e escritor, nascido em Valença do Piauí (1929). Formado pela Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil (1953). Médico efetivo do Serviço Nacional de Doenças Mentais, aprovado em concurso público em 1º lugar. Diretor do Instituto de Psiquiatria da UFRJ. Foi professor titular de Psiquiatria, Psicologia e Psicopatologia na Faculdade de Ciências Médicas da UERJ. Professor titular de Psiquiatria e Saúde Mental da Faculdade de Medicina da UFRJ. Integrou bancas examinadoras para ingresso de professores na área de psiquiatria nas principais universidades do país, entre as quais USP e Unicamp. Membro titular da Academia Nacional de Medicina. Presidiu a Federação das Associações Psicanalíticas da América Latina (1988-1990). Presidiu o 18º Congresso Latino Americano de Psicanálise com a participação de mais de mil congressistas. Pertence à Academia Piauiense de Letras. Bibliografia. Obsessão e Delírio: neurose e psicose, 1956; Fundamentos da Psiquiatria, 1963; Lobotomia em Pacientes Esquizofrênicos, 1954; Técnicos do Sono Prolongado em Psiquiatria, 1954; O Sentido do Tempo no Homem, 1955; Investigação com a Dietilamina do Ácido Lisérgico, 1955; A Direção Fenomenológica em Psiquiatria, 1955; Motivação da Escolha da Carreira Médica, 1959; Sobre Delírios, 1974; Dinâmica de Um Caso de Neurose Obsessiva, 1973; Conceito de Psiquiatria, 1973; O Médico; Seu Paciente e a Doença, 1975, e Problemas Psicológicos na Patologia Respiratória, 1974.

Fragmentos do seu discurso por ocasião de sua posse na Academia Piauiense de Letras:

“[…] A todos deve estar ocorrendo a pergunta: o que faz um psicanalista numa Academia de Letras? Em 1936, quando Freud estava sendo homenageado pelos 80 anos, foi escolhido para saudá-lo não um psiquiatra ou um psicanalista e sim Thomas Mann, o grande escritor da Montanha Mágica. No discurso que fez reconhece a influência da filosofia e da psicanálise em sua obra exatamente pelas raízes comuns que as fazem convergir para os mitos “tão congênito, diz Mann, é para a psicanálise o interesse mítico como congênito é para a atividade literária o interesse psicológico. A insistência da psicanálise no retorno à infância da alma individual. É, também, já a insistência a um retorno à infância do ser humano aos primitivos e aos mitos”. E acrescenta: “o mito vivido é a ideia épica de minha novela (José e seus irmãos) e me dou conta de que a partir do momento em que Eu, enquanto narrador, dei o passo que leva do individual, burguês ao burguês típico, minha relação com a esfera psicanalítica entrou, por assim dizer, em seu estágio agudo”. O saber psicanalítico é algo que transforma o mundo, sentencia Thomas Mann.

A origem dessa sedução entre psicanálise e literatura já se encontra nos textos freudianos. Foi com os escritores que Freud fez o seu maior aprendizado. Muitas de suas instituições estão em Shakespeare que é citado em quase todas as suas obras. Aprendeu espanhol, para ler Cervantes no original. E chegou a fundar na adolescência uma Academia Castelhana com Silberstein, um amigo, na qual se apelidavam com os nomes de dois cães de um conto célebre do autor de Dom Quixote. É verdade que a psicanálise exerce, hoje, uma influência em toda a vida moderna. Na linguagem habitual do intelectual, da mídia, da dona de casa é frequente ouvir as palavras forjadas por Freud no desenvolvimento da psicanálise. Conceitos como repressão, complexo, sublimação, recalque, estão no vocabulário de todas as pessoas mesmo que nunca tenham lido Freud. Talvez tenha sido o grande ensaísta e biógrafo Richard Ellmann que tenha mostrado com a maior clareza a influência da psicanálise na vida em geral, quando diz: É difícil abrir a boca sem se notar a influência de Freud na linguagem. Conversamos despreocupadamente sobre as inclinações sexuais das crianças, sobre as rivalidades dos irmãos, sobre as dependências para com a mãe, sobre impulsos sadomasoquistas.

Ellmann acrescenta: “talvez a parcela da sociedade mais abalada com o advento de Freud tenha sido a comunidade literária”. No século XIX a literatura foi se acostumando cada vez mais a reivindicar autonomia, como esfera privilegiada e separada. Palavras como ARTE e ARTÍSTICO assumiram uma dignidade extraordinária. A psicanálise destruiu tais pretensões, de várias maneiras diferentes. Primeiro ao sustentar que todos nós, artistas e não artistas, estamos envolvidos na produção crônica de fantasias simbólicas, em sonhos ou divagações, num onirismo mais ou menos controlado. Sendo assim os artistas não formam uma elite e são muito parecidos com as outras pessoas. Por outro lado a psicanálise, disciplina nascente, retira da literatura antiga termos como édipo e narciso e, em certa medida, toma-os como antecipações, de modo que o emprego literário deles se torna mera ilustração de princípios mais amplos. De fato, a palavra édipo, hoje em dia, faz-nos pensar em Freud, não em Sófocles. Isso porque a psicanálise pretende uma antiguidade ainda maior: os édipos já existiam antes que Sófocles escrevesse sobre um deles. Por tudo isso, Freud continua sendo um modelo, ainda que indubitavelmente espinhoso.

Em verdade, a influência de Freud tem sido enorme e crescente em quase todas as artes. Na pintura, não apenas o movimento surrealista mas toda a fase moderna está marcada pela psicanálise. O teatro, hoje, tem nítido acento freudiano. Os grandes nomes do cinema, Bergman, Felini, Bunuel e tantos outros seriam inconcebíveis sem a valorização do mundo interno e dos sonhos como parte fundamental do humano.

Em 1895, Freud já registrava que seus relatos clínicos pareciam mais com novelas do que com antigas observações neurológicas que havia feito. Eram, entretanto, biografias especiais sem heróis nem vilões assim como sem a dominância do tempo físico subordinado agora ao tempo mais próprio do homem que, tal como num sonho, não distingue nem passado nem futuro. Tudo faz parte de um presente mais rico. O espaço também não é o geográfico. A praça Pedro II pode aparecer ao lado do Pão de Açúcar sem que isso inquiete ou espante porque este é o mundo mais global em que vivemos. Em Freud os sentimentos não são quimicamente puros e por isso as virtudes têm os seus vícios e os próprios defeitos, por vezes, assumem certa grandeza.

A paixão de Freud pela literatura teve início na juventude. Em sua correspondência dessa fase encontramos enorme interesse pela filosofia. Especialmente Feuerbach, Locke, Hume. Em Paris, à distância da noiva, consolava- se relendo Dom Quixote, os Trágicos Gregos, Rabelais, Molière, Lessing, Goethe, Schiller e, sobretudo, Shakespeare, sua maior admiração literária.

Em um pequeno e magistral ensaio de 1908, chamado “Escritores criativos e devaneio”, Freud lança as bases daquilo que se poderia chamar de “estética psicanalítica”. Inspirado, talvez, na “poética” de Aristóteles, mostra que há uma continuidade genética entre o brincar da criança, o devaneio de todos nós, os sonhos e a criação artística. Dentro dessa perspectiva poderíamos ver o texto literário como resultante da capacidade maior ou menor de mergulho nessa realidade mais profunda aliado ao poder de traduzi-la para os leitores, suscitando-lhes as emoções de que são capazes. Tanto o autor ao produzir seus trabalhos como os leitores, realizam, simbolicamente, desejos reprimidos tal como a criança o faz através dos seus jogos: “manipulando-se a realidade, cria-se uma outra cena” onde tudo pode acontecer. Passado, presente e futuro se misturam numa temporalidade sujeita apenas às manipulações do desejo. Isso compõe a famosa “sedução estética”.

A forma literária com toda sua beleza teria a mesma função sedutora do “prazer preliminar” erótico. Ao derrubar as barreiras da repressão, permite que se libere um prazer mais intenso e mais profundo.

Mesmo tendo se ocupado de outras formas de arte, era o escritor e sobretudo o poeta que Freud tinha em mente quando aludia a natureza da criação artística. Confessava uma certa inveja da facilidade com que os escritores atingiam intuições profundas sobre o homem, enquanto o psicanalista só conseguia resultado semelhante após penoso e demorado trabalho. Perguntava: Por que é que ainda hoje, depois de volver de tantos séculos ainda ficamos emocionados com a tragédia do Édipo Rei? Isso ocorre porque Sófocles atingiu uma verdade profunda e universal do ser humano.

Se Freud exerce tanta influência sobre a literatura, foi também enormemente influenciado pelos grandes escritores. Entre os seus precursores estão os trágicos Gregos, Shakespeare, Goethe, todos autores que relia com freqüência, e cita abundantemente em suas obras. Foi a partir dessas influências que empreendeu a tarefa de exame minucioso e exaustivo da vida de seus pacientes e da sua própria, decidindo a não esconder nada, mesmo os achados que lhe fossem mais difíceis.

Desse modo, consistiu sua grandeza que o faz consoante o corpo editorial da revista TIME um dos candidatos ao homem do milênio quando concorrerá com Miguel Ângelo, Leonardo da Vinci, Shakespeare, Newton, Einstein e tantos outros de igual estatura.

Uma de suas frases prediletas e citadas era de Hamlet: “Se cada um de nós fosse tratado como merece, quem escaparia ao açoite?”. Essa consciência humilde dava a Freud uma grande tolerância e respeito para com todos os aspectos do humano. Não foi entretanto nenhum santo. Cometeu muitos erros, embora procurasse sempre a verdade. Habitualmente é mal compreendido, sobretudo pelos que o conhecem de segunda mão, em divulgações simplificadoras. Apesar de tudo isso, foi, indubitavelmente, um dos homens que marcam com maior forma o século em que vivemos.

Entre as descobertas de Freud está o interesse na investigação do passado para entender melhor o presente-futuro. Esse é o trabalho diário de todo analista. As influências, sobretudo as mais primitivas, exigem um exame exaustivo e demorado. Os ambientes de Valença e Teresina tatuaram de modo indelével minha infância e adolescência. As minhas raízes estão aqui. Para reforçar esses vínculos, postulei a Cadeira 16 que, para mim, tem um valor simbólico ainda maior, por razões fáceis de entender. Agradeço a generosidade dos acadêmicos que me permitiram atingir esse objetivo.

Como assina T. S. Eliot “Atingir um fim é atingir um começo”. O fim é o ponto de onde encetam a jornada.

Comentários 

Eustáquio Portela, com a força de sua inteligência e as gamas da sua cultura, vem dedicando-se, desenganadamente, à pesquisa e aos estudos da ciência médica, chegando a ser hoje um dos seus luminares. Especializou-se em psiquiatria, dedicando-se num trabalho de pesquisas percucientes a profundar-se os arcanos, visando minorizar o sofrimento dos que, perdida a razão, vivem um mundo diferente. Os seus limites científicos ultrapassaram as lindes nacionais. (Wilson Carvalho Gonçalves)

Fonte: Revista da Academia Piauiense de Letras (1992); e GONÇALVES, Wilson Carvalho, Grande Dicionário Histórico-Biográfico Piauiense. Teresina: Editora Júnior Ltda. 1997.

CID DE CASTRO Dias

(1942). Sexto e Atual Ocupante da Cadeira nº 15 da APL. 

Filho de Manoel da Silva Dias e Ester de Castro Dias, nasceu em 25-01-1942, na cidade de S. Raimundo Nonato (Piauí), tendo alí cursado o 1º grau no Ginásio Dom Inocêncio. Em Salvador (BA), cursou  o  2º  grau  escolar (antigo  científico). Engenheiro Civil, formado pela Universidade Federal do Ceará (1968).

Funcionário de carreira da Secretária de Obras do Piauí, hoje aposentado, onde exerceu os cargos de: Fiscal das Obras do Estádio Alberto Silva (Albertão) – Sub-Secretário de Obras em duas administrações – Diretor da Divisão de Conservação e Coordenador de Obras Especiais. Trabalhou na Empresa de Obras Públicas do estado do Piauí – EMOPPI, tendo desempenhado as funções de Gerente de Acompanhamento de Obras e Assessor Técnico-Econômico. Professor aposentado do IFPI, antigo CEFET. Ex-Secretario de Projetos Estruturantes da Prefeitura Municipal de Teresina. Ex-Diretor da PRODATER – Empresa Teresinense de Processamento de Dados (PMT). Agraciado com as medalhas Mérito Conselheiro Saraiva da Prefeitura de Teresina e Mérito Renascença do Governo do Estado do Piaui.

Membro da Academia Piauiense de Letras ocupando a cadeira nº 15, sendo sucessor de Deoclécio Dantas. E também é membro da Academia de Ciências do Piauí.

Escritor, autor dos livros: Os caminhos do rio Parnaiba, Piauí – obras que estruturntes, Piauí – das origens à nova Capital e Piauí – obras que desafiam.

ALTEVIR Soares de ALENCAR

(1934). Quinto e Atual Ocupante da Cadeira nº 14 da APL. 

(Alto Longá-PI, 26-3-1934). Professor, advogado, jornalista, poeta, cronista e improvisador. Teve participação muito intensa na imprensa dos Estados do Ceará, Pernambuco, Mato Grosso do Sul e Piauí. Curso Superior de Filosofia pura (5 anos) na Universidade do Brasil (RJ), e de Direito, na Universidade Católica de Mato Grosso (MT). Mestrado em Direito Penal na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O Escritor. Obras poéticas: Sonho e Realidade (1956); Eterno Crepúsculo (1961); Poemas da Solidão (1962); Dentro de Mim (1968); Êxtase (1973); Anda; Vem Cá, e o Livro de Sonetos. Professor de Língua Portuguesa e Literatura Luso-Brasileira na Moderna Associação Campo-grandense de Ensino (Campo Grande-MS) e lente de Direito Penal na Universidade Católica de Mato Grosso (MS). O Político. Foi prefeito de Nioaque e secretário de cultura do Mato Grosso do Sul (1983-1985). Pertence à Academia Sul-Mato-Grossense de Letras, ao Clube de Poesia de Recife e à Academia de Letras do Vale do Longá. Em junho de 2000, ingressou na Academia Piauiense de Letras.

HÁ UM POUCO DE DEUS

Cada nuvem que passa é um céu que vai descer Sobre o mundo interior das almas compassivas Vive o amor, esse amor que vem das coisas vivas E alimenta sorrindo a angústia de viver.

Súplicas, ais, queixumes, prantos, rogativas, Tudo ressumbra à voz do mundo a se mover. Desce o raio febril que dá existência ao ser, Como um sopro de paz nas emoções altivas.

O gemido da terra e o gemido das vagas… Quanta vez, a pensar, o homem se tortura Vendo plagas no chão, vendo no oceano plagas!

E maldade Infeliz que achata este universo? N’alma de cada poeta há no mundo de ternura, Há um pedaço de Deus dentro de cada verso!

Comentários 

Poeta, na mais completa acepção deste vocábulo. Altevir Alencar tem enriquecido a bibliografia específica brasileira com domínio e segurança invejáveis. Faz versos porque nasceu para isso. O resto é conversa. (Austregésilo de Athayde, Presidente da Academia Brasileira de Letras).

Fonte: GONÇALVES, Wilson Carvalho. Antologia dos Poetas Piauienses. Teresina: Halley, 2005.

Pedro da Silva Ribeiro

(1930). Quarto e Atual Ocupante da Cadeira nº 13 da APL. 

Nasceu em Guadalupe, 14-02-1930. Professor, romancista, contista e historiador. Lecionou nos mais importantes colégios de Teresina: Escola Normal Oficial “Antonino Freire e Colégio “Sagrado Coração de Jesus”. Foi diretor do colégio “Eurípides de Aguiar” (1960). Professor universitário, lecionando na Fundação Educacional do Distrito Federal. Alto funcionário do Tribunal de Contas da União. Bibliografia. Publicou o romance Vento Geral, 1982, e a obra Sol Poente, contos, 1985. Pertence à Academia Piauiense de Letras.

Comentários 

[…] Mas, sobretudo, existem as paixões que vâo construindo a vida, a malha fina com que um pequeno mundo se tece e se transformo, tudo isto é bem recontado e bem recriado por Pedro Ribeiro; que mistura lembrança e imaginação numa forma tâo viva e natural que põe em dúvida o seu gênero literário: será ficção ou memória? Será que temos de reescrever este livro e dar-lhe outro título: “Aventuras de Pedro Belas-Artes no Vale do Engano?”. (H. Dobai, sobre a obra Vento Geral)

Mas não há dúvida de que Vento Geral é um grande livro: é um mural de traço e de cores muito nítidos, que não esquecemos, pois com ele o nosso rio preguiçoso, que se compraz no seu curso, fica sendo uma água pesada na memória, um rio subterrâneo que cada vez mais se afunda no peito.

Fonte: RIBEIRO, Pedro da Silva. Vento Geral. 2. ed., 1996.
RIBEIRO, Pedro da Silva. A Divisa. Teresina: Academia Piauiense de Letras, EDUFPI, 2017, Coleção Centenário nº 60.